Estadão chama espionagem da Abin de Bolsonaro de “bisbilhotagem”: “Devaneios autoritários”

Atualizado em 27 de janeiro de 2024 às 10:23
O ex-presidente Jair Bolsonaro e o ex-chefe da Abin Alexandre Ramagem. Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

Em editorial publicado neste sábado (27), o Estadão disse que a espionagem ilegal da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) foi um instrumento de “bisbilhotagem” e classificou as atitudes do ex-capitão como “devaneios autoritários”:

É gravíssima a suspeita de que, durante o governo de Jair Bolsonaro, a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) teria sido convertida num arremedo de SNI, o serviço de espionagem que serviu à ditadura militar. A ser verdadeira apenas uma fração do que veio a público até o momento, é caso para punição exemplar de todos os que tentaram instalar no Brasil um instrumento de bisbilhotagem típico de Estado autoritário. (…)

Não bastasse essa espionagem ilegal, Ramagem também é suspeito de fazer da Abin uma espécie de puxadinho das equipes de defesa de dois dos filhos de Bolsonaro enrolados com investigações policiais: o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), suspeito de liderar um esquema de “rachadinhas” na Assembleia do Rio, e Jair Renan Bolsonaro, suspeito de tráfico de influência, estelionato e lavagem de dinheiro.

A existência de uma “Abin paralela” nunca foi segredo desde que o próprio Bolsonaro, na infame reunião ministerial de 22 de abril de 2020, jactou-se publicamente de contar com os préstimos de uma rede de informação “particular” – que “funciona”, como enfatizou. O que o jornal O Globo revelou em março de 2023 e a PF investigou até agora é o possível uso de recursos oficiais e legítimos à disposição do órgão de Estado para atender aos interesses particulares, e possivelmente ilegais, do então presidente da República.

Fachada da Agência Brasileira de Inteligência em Brasília. Foto: Reprodução/Abin

Integrante do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, a Abin tem entre suas atribuições “avaliar as ameaças, internas e externas, à ordem constitucional”. Causa um frio na espinha constatar que as investigações da PF apontam para o fato de que a própria Abin pode ter se tornado uma dessas ameaças à Constituição, possivelmente violando direitos e garantias fundamentais de cidadãos brasileiros sem outras justificativas a não ser o furor de Bolsonaro por bisbilhotar tudo e todos que pudessem representar ameaça à consecução de seus objetivos. (…)

A ser verdade o que se levantou até agora, a subversão da Abin – além de violar a privacidade individual, direito resguardado pela Constituição – expôs o País e a sociedade a riscos não triviais. A vigilância ilegal dos cidadãos opera sob a lógica do medo e da desconfiança generalizada, o que, ao fim e ao cabo, constrange a dissidência política e a liberdade de expressão, vitais para a democracia. Tem ainda o condão de instaurar um estado de medo permanente, impedindo a livre participação dos cidadãos na vida política do País.

Não menos importante, a transformação da Abin num aparato de inteligência a serviço da família Bolsonaro, se comprovada, também revela uma tentativa de construir um Estado com poder desmedido sobre os cidadãos, poder que, sem controle, pode ser facilmente manipulado. Não era necessária nenhuma investigação da Polícia Federal para concluir que este era o sonho de Bolsonaro e sua grei. Felizmente, ao que parece, o sonho frustrou-se.

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