As crianças mortas que nós desprezamos

Atualizado em 9 de abril de 2013 às 7:51

Os americanos vão devastando o mundo árabe sob o silêncio omisso de todos nós.
 

Elas não vão acordar
Elas não vão acordar

E então leio, neste final de domingo:

“Doze civis morreram no sábado, durante um ataque aéreo das forças comandadas pelos americanos numa aldeia do distrito de Shigal, província de Kunar, junto à fronteira com o Paquistão. Segundo a Reuters, os mortos são 11 crianças e uma mulher. Seis outras mulheres ficaram feridas.”

Vejo a foto e fico em dúvida sobre se a publico. Decido que sim: o mundo tem que ver isso. Tem que se indignar.

Até quando vamos suportar isso? Já pensaram se fossem crianças americanas?

É uma rotina, lamentavelmente.

Vou contar uma história.

Em dezembro de 2009, o jornalista iemenita Abdulelah Shaye foi a uma aldeia em seu país para investigar a morte de dezenas de pessoas num bombardeio. A alegação do governo do Iêmen era que se tratava de terroristas da Al-Qaeda, o grupo de bin Laden.

O que Shaye descobriu foi algo bem diferente.

Crianças e mulheres tinham sido mortas, e não terroristas. Ele também encontrou destroços em que estava escrito “made in USA”. O Iêmen não tem as armas utilizadas no bombardeio.

Fora, na verdade, uma ação americana, não do Iêmen. E o meio foram os controvertidos drones, os aviões teleguiados que disparam mísseis sem que haja tripulação. Um dos documentos vazados pelo Wikileaks sobre as atividades da diplomacia americana mostrava que a Casa Branca combinara com o Iêmen que este assumiria a responsabilidade em caso de ataques como o da aldeia para a qual fora, como jornalista, Shaye.

Isso evitaria não só desgaste de imagem como a economia de dinheiro em indenizações por mortes de inocentes.

O furo de Shaye lhe valeu duas coisas. A primeira, aplausos entre os iemenistas, cansados de um governo corrupto, ditatorial e subserviente aos Estados Unidos.  A segunda, a cadeia. O governo do Iêmen acusou-o de vínculos com a Al-Qaeda – sem provas — e o prendeu.

Os inocentes mortos no Iêmen – ou no Afeganistão, ou no Iraque – têm escasso valor, quando comparados aos inocentes mortos no Ocidente. São vítimas invisíveis, ignoradas no mundo — choradas apenas num canto que para nós, ocidentais, não é nada.